6 de fev. de 2010

Foi barrado o retrocesso?

Na próxima semana o artigo que abaixo se publica vai fazer o seu primeiro aniversário. Ele foi escrito em oposição a uma proposta equivocada apresentada no Conselho Superior do IESP, no início de 2009, que tinha por objetivo afastar o IESP da Academia, pondo um fim na oferta de cursos de pós-graduação pelo Instituto.

O texto expressa o início dos debates naquele órgão colegiado. Ele foi publicado em dois blogs, dentre eles no BLOG DO DPC DO PARÁ
(wwwdpcdopara.blogspot.com),tendo recebido dois comentários que vão reproduzidos ao final.

A republicação do artigo ocorre quando se observa uma discussão no seio da instituição sobre a qualificação do policial civil paraense, mais especificamente se deve ou não a Polícia Civil manter a exigência de curso superior para ingresso na instituição.

Segue o texto tal como foi publicado um ano atrás, desta vez acompanhado dos comentários feitos pelos delegados Jerônimo Coelho, da Diretoria de Assistência ao Servidor, e Adonai Matias, presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Pará.


Dez anos após a sua criação convém ao IESP afastar-se da academia?


Pedro Paulo Sousa
pedrosantarem@yahoo.com.br


RESUMO

Este texto trata da discussão iniciada na reunião do Conselho Superior do Instituto de Ensino de Segurança do Pará, a respeito da parceria do IESP com a Academia e da possibilidade desta relação vir a ser interrompida. Registro aqui o posicionamento que adotei por ocasião da referida reunião.


PALAVRAS-CHAVE: Ensino em Segurança Pública, Academia, Pós-graduação.

Entre os que se interessam pelo tema é comum admitir-se a insuficiência do sistema público de ensino brasileiro, restando evidente que o Estado não tem conseguido garantir em quantidade e qualidade o direito a educação aos brasileiros, enquanto requisito fundamental para a construção de um Brasil mais justo e mais democrático.

Zagury (2007), contudo, prefere falar de ineficiência da educação em nosso país. E afirma que as análises das causas deste fracasso, na maioria das vezes, não estariam sustentadas em estudos, mas apenas em opiniões.

Esta constatação pode suscitar a seguinte pergunta: e o ensino na área de segurança pública, a quantas anda? Ele se enquadra nesta dura realidade ou por algum motivo representa uma espécie de exceção à regra?

O respeitado Nóvoa (2009), lembra, entretanto, que as escolas valem o que vale a sociedade. E que não seria correto sonhar com escolas extraordinárias, onde tudo funcionasse as mil maravilhas, numa sociedade onde nada funciona bem.

No Pará, há quase dez anos, a formação e o aperfeiçoamento dos profissionais de segurança pública são responsabilidades do Instituto de Ensino de Segurança do Pará, o IESP, em conjunto com as unidades acadêmicas das organizações que compõem o sistema estadual de segurança pública.

Estas instituições, pretendendo que seus profissionais venham a atender com mais eficiência e eficácia às necessidades de uma sociedade que a duras penas se democratizou, tem procurado valorizar as questões relacionadas à cidadania e aos direitos humanos, que passaram a ganhar maior atenção nos currículos dos diversos cursos. Ouvem-se também preocupações com certo divórcio entre a teoria vivenciada em sala de aula e a prática cotidiana desses profissionais.

Em se tratando de ensino em segurança pública é exagerado dizer que não se observa atitudes concretas visando estimular estratégias de reconhecimento e mensuração desta realidade? É correto dizer que, neste particular, faltam estudos e sobram improvisações? Estaria, desde o início, ocorrendo com o ensino em segurança pública aquilo que o professor Demo (2001) identifica como o “café velho passado para frente”?

Por ocasião da última reunião do Conselho Superior do IESP, realizada em 12.02.09, com a finalidade de apreciar e deliberar sobre projetos pedagógicos de cursos de aperfeiçoamentos e especializações (entenda-se CAODP e CSPBM), ouviu-se de um conselheiro que estes cursos, promovidos em convênio com uma IES não estariam atendendo as necessidades da sua organização. Mais claro que isso, impossível!

Mencionou-se também uma pesquisa elaborada por profissional de segurança pública num dos cursos de aperfeiçoamento/especialização, cujo tema versou sobre a Qualidade da Água da Bica do Aurá. Embora não tenha sido dito é sabido que o curso é de Especialização em Segurança e Proteção Ambiental.

Falou-se também, dentre outras coisas, sobre as dificuldades encontradas no trato com a gestora de certa IES, enquanto fator complicador para a renovação do convênio e manutenção da parceira entre o Instituto e a Academia. Sem acordo, a proposta seria o IESP afastar-se da Academia, justo no ano em que o instituto completará dez anos de existência.

Que outras pesquisas foram realizadas pelos pós-graduandos além daquela que investigou A Qualidade da Água da Bica do Aurá? Talvez uma boa avaliação dos cursos, que colocasse esses e outros dados sobre a mesa, poderia permitir uma tomada de decisão mais tranqüila. Ocorre que não existem avaliações consistentes. Há interesse em realizá-las?

Durante a recente visita do Ministro da Justiça, Tarso Genro, ao IESP, o Secretário de Segurança Pública do Pará lembrou da intenção do Instituto em tornar-se uma IES, ao que o ministro - quando se dirigia ao bloco onde estava alojada a Força Nacional -, respondeu: pode contar conosco!

Diz-se que o caminho da autonomia pretendida pelo IESP é longo, que já foi tentado, e que parou porque implica em mudanças na legislação.

Pois bem, se a opção escolhida for mesmo pelo afastamento do IESP da Academia, lembro que em recente visita à Academia Nacional de Polícia, da Polícia Federal, tomei conhecimento que o Ministério da Educação autorizou a referida academia a promover cursos de pós-graduação em nível de especialização, na área de segurança pública, tornando desnecessário o convênio com IES. Quem sabe a ANP não nos ensinaria o caminho das pedras!

Ao meu juízo, primeiro é preciso compreender o que está acontecendo para depois mudar. Sem uma avaliação consistente da parceria e seus resultados, a proposta de afastamento do IESP da Academia revela-se prematura. E assim, carecendo de indicadores para fundamentar a tomada de decisão, melhor seria andarmos com cautela, pois café velho por café velho, com todo o respeito, prefiro o da minha avó.



REFERÊNCIAS

ZAGURY, Tânia. O professor refém: para pais e professores entenderem porque fracassa a educação no Brasil. Rio de Janeiro: Record, 2007.
DEMO, Pedro. É Errando que a gente aprende. Revista Nova Escola On-Line, Ed. 0144, Agos de 2001. Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/edicoes/0144/aberto/mt_246742.shtml Acesso em: 14 fev. 2009
NÓVOA, Antônio. O professor pesquisador e reflexivo. Entrevista. Disponível em: http://www.tvebrasil.com.br/salto/entrevistas/antonio_novoa.htm Acesso em: 14 de fev. 2009
__________________
1 Delegado de Polícia e Pós-Graduando em Docência do Ensino Superior.


COMENTÁRIOS:

Anônimo disse...

Pedro,

seu artigo merece os aplausos, sugiro até que seja publicado no site da Polícia Civil do Pará, para iniciarmos a discussão sobre o tema, com toda a "virulência", o artigo é de belíssima feitura e retrata um possível retrocesso que estão querendo desenhar, nós, membros desse sistema temos que repudiar essas atitudes que vão de encontro ao tudo que é pregado pela vanguarda do bom pensamento em segurança pública, ou você especializa os membros desse sistema de segurança pública ou ficaremos remando contra a maré, como fazemos hoje. Parabéns, o artigo será postado ainda hoje no blog "jfcsantos.blogspot.com"
Ps. A discussão só começou.
Jeronimo Coelho
SEXTA-FEIRA, MARÇO 13, 2009


Adonai disse...

Pedro,

Parabens pelo artigo, concordo plenamente com o exposto e penso que a formação policial bem como as especializações devam ser repensadas a começar pela escolha do gestores do IESP, entendo que deve recair dentre os profissionais do meio e que conheçam do oficio de ensinar.

Por outro lado, falta estimulo aos colegas em especializar-se, pois nada influirá em seu conceito na instituição.
SÁBADO, OUTUBRO 31, 2009

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